— Vocês estão gostando?
As quase cinquenta mil pessoas reagiram com gritos e assobios à pergunta de Paige.
— Eu não ouvi direito — Paige falou, fazendo uma concha com a mão perto do ouvido, em seguida, virou o microfone para o público mais uma vez.
Os gritos foram ainda mais intensos e agudos e pude ver ela abrindo um sorriso; aquele sorriso que eu tanto amava e que fazia até o dia mais chuvoso parecer uma manhã ensolarada de primavera.
Eu mantinha o acompanhamento no teclado à minha frente por puro instinto, porque não conseguia tirar os olhos dela. Tinha algo mágico na forma com que ela fazia aquele palco imenso parecer pequeno e em como a sua presença era suficiente para preenchê-lo.
Paige tinha o público nas mãos e sabia disso.
Ela aproveitou o intervalo causado pelo barulho para tomar um gole de água da garrafinha que sempre ficava ao lado do pedestal do microfone.
— Antes da próxima música — Ela pausou para beber outro gole —, eu queria apresentar a banda.
Tampou a garrafa, tirou mais uma vez o microfone do pedestal e começou a caminhar pela extensão do palco. Paige passava a maior parte do show andando ou mesmo correndo.
Era como uma criança hiperativa que não conseguia ficar parada nem por um segundo. Eu não sabia de onde vinha tanta energia, mas adorava assistir. Especialmente porque, nesse ato do show, ela vestia uma calça cargo preta e um top frente única da mesma cor que sempre me distraía.
Ela não tinha o abdômen definido ou um corpão cheio de curvas nem nada disso, na verdade ela era bem magrela, daquele tipo que você se questiona para onde vai toda a comida que ingere. Mas era a sua presença de palco que a fazia parecer a mulher mais sexy do mundo e, naquele top curtíssimo, ela ficava ainda mais gata.
Era o meu look preferido na turnê inteira.
Paige caminhou até a outra extremidade do palco, na parte mais afastada de mim, antes de dar início às apresentações.
— Começando pela guitarra, com a minha cara-metade musical… — Paige falou no microfone. — Ela que é o John do meu Paul, o Garfunkel do meu Simon, o Chewbacca do meu Han Solo e a pessoa mais criativa que eu conheço, Dani Garcia!
O som das pessoas no estádio encobriu o solo de guitarra da Dani. Ela era quase tão popular quanto a Paige e juntas eram as nossas principais compositoras, além de Dani ser a nossa segunda vocalista.
Eu também costumava compor e, muitas vezes, me juntava às duas, mas eu preferia escrever baladas enquanto elas eram as nossas compositoras oficiais de singles pop e as responsáveis pelos nossos maiores sucessos.
— E para deixar claro, eu sou o Han Solo — Dani falou no microfone assim que o público parou de gritar, arrancando risadas dessa vez.
— A gente decide isso mais tarde — Paige rebateu com uma risadinha, então se virou para a direita. — No baixo — Ela fez duru duru com a boca, imitando o som do baixo antes de continuar —, o ícone fashion e cérebro dessa banda. A principal responsável pela nossa saúde física e mental, que nos obriga a comer bem e fazer exercícios todos os dias. A primeira e única Hollie Derrick!
Mais uma vez os gritos e assobios encobriram o som do baixo.
Assim como eu, Hollie não era tão expansiva quanto Dani e Paige, mas de certa forma, era a gerente da banda e foi graças a ela que chegamos aonde chegamos.
Apesar de Paige ser a vocalista, era Hollie que assumia o papel de líder nas horas importantes; era ela que sempre questionava os contratos e garantia que não estivéssemos fazendo nenhuma besteira. Às vezes, podia ser meio controladora, mas era impossível não gostar dela.
Paige continuou a sua peregrinação pelo palco.
— Na bateria, o anjo que caiu na terra e a única alma pura o bastante para conseguir aguentar o mau-humor matinal da Dani…
— Ei! — Dani protestou, arrancando mais risos do público.
— …a dona dos penteados mais estilosos e demorados — Paige continuou, ignorando o protesto. — E a maior viciada em sorvete de pistache que você vai conhecer. Quero ouvir os aplausos para a adorável Chloe Jacobs!
Chloe certamente não tinha o estereótipo comum de baterista. Ela era meiga e delicada e não tirava o sorriso do rosto por nada, ainda assim, quando estava de frente para a sua bateria, era inegavelmente uma rockstar.
Por isso mesmo, o público a amava e, em quase todos os shows, era possível ver muitos cartazes para ela. A maioria pedindo as suas baquetas autografadas.
— Por último, mas não menos importante… — Paige falou, finalmente se virando para mim; então nossos olhos se encontraram pela primeira vez em vários minutos.
Era impossível não sorrir para ela, especialmente quando ela sorria daquela forma para mim.
— A tecladista mais habilidosa que eu conheço…
Ela continuou caminhando e se sentou ao meu lado na banqueta em frente ao teclado. Ela fazia isso em todos os shows e, em todos eles, eu sentia meu coração acelerando quando os nossos quadris se tocavam.
— …e a mulher mais linda que já pisou na terra — Paige continuou, sem desviar os olhos de mim. — A única capaz de me acalmar antes de um show e a pessoa mais sensata entre nós. Quero ouvir os gritos para a rainha das baladas — Ela fez uma pausa, que eu sabia que era o espaço para acrescentar o ‘e dona do meu coração’ que ela sempre falava nos ensaios, mas não podia falar no palco — Jenna Milano!
Era impossível desfazer o sorriso no meu rosto enquanto eu tocava as notas que já eram tão automáticas que não exigiam qualquer esforço. Como sempre, Paige entrou na segunda parte, fazendo o acompanhamento na metade inferior enquanto eu seguia com a melodia na metade superior.
Apesar de ser um dos momentos preferidos do público e das quase cinquenta mil pessoas gritando, naquele momento, era como se fossemos apenas nós duas tocando no nosso quarto, sem mais ninguém nos vendo.
A única coisa melhor que tocar com ela naquela hora, era o beijinho que ela plantava na minha bochecha antes de se levantar.
Os lábios macios e quentes dela se grudavam por apenas um segundo no meu rosto, mas era o momento pelo qual eu esperava o show inteiro.
Chloe dizia que a gente dava muito na cara sobre o nosso relacionamento, mas sinceramente, era impossível esconder o quanto eu estava apaixonada. E Paige… bem, Paige era o ser mais sincero com os próprios sentimentos que eu conhecia, e eu sabia que para ela era ainda mais difícil disfarçar. Isso só me fazia a amar mais ainda.
Ela caminhava de volta para o centro do palco para continuar com o cronograma, mas eu a conhecia bem o suficiente para saber que o sorriso afetuoso que ela tinha no rosto depois de me beijar era diferente do sorriso performático que ela usava a maior parte do tempo que estava no palco. E eu sentia o meu coração derretendo todas as vezes que o via sendo endereçado a mim.
— E no vocal… — Dani falou ao microfone enquanto Paige colocava a alça da guitarra para a próxima música — …na guitarra, na gaita e, às vezes, na bateria e teclado. A única brasileira incapaz de sambar e certamente o Chewbacca do meu Han Solo, Paige “PJ” Joaquim!
— Com certeza não a única — Paige respondeu por cima dos gritos e aplausos.
Não importava o quão popular cada uma de nós éramos, Paige era a dona do palco e a preferida dos nossos fãs. E não tinha como ser diferente, ela era a alma da banda e a cola que nos mantinha unidas. Os fãs sabiam disso, por isso a amavam tanto.
Ela era filha de mãe brasileira, mas havia vivido a maior parte da vida na Califórnia, e Dani estava certa, Paige era incapaz de sambar, por mais que ela tentasse. E era adorável vê-la tentando.
O público, no entanto, não se importava com isso e os milhares de cartazes falando que a amavam, pedindo autógrafo, falando que vieram de sei-lá-onde só para vê-la ou até mesmo a pedindo em casamento cobriam o mar de gente que gritava o seu nome. O barulho era tão ensurdecedor que eu mal ouvia o retorno no meu ouvido da música que estávamos tocando a introdução.
— E nós somos Pink Lemonade! — Paige gritou no microfone apenas alguns segundos antes da sua entrada no vocal.
If You Don’t Mind era a nossa música mais famosa e a favorita do público. Eu sentia os pelos do meu braço se arrepiando com quarenta e oito mil pessoas cantando com a Paige em um dos estádios mais emblemáticos do mundo.
Aquele foi sem dúvidas o auge da nossa carreira.
E o início do fim.
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